Ontem tive conhecimento do desaparecimento de alguém que me marcou, que muito me ensinou e que se tornou (ainda que apenas através de correspondência escrita) meu amigo. O Professor Doutor Joaquim de Montezuma de Carvalho (que fez um comentário muito elogioso ao meu livro "Outonalidades") deixou de privar connosco. Contudo, a sua presença e sabedoria permanecerão entre nós. Vivas, assim o espero. O Ad Litteram reproduz aqui a notícia publicada ontem no jornal "O Primeiro de Janeiro".
A esse grande vulto da culturalidade, a minha Justa Homenagem. Até já amigo...
«Um mensageiro da universalidade
Joaquim Montezuma de Carvalho faleceu ontem, às 6h40, no Hospital S. José, em Lisboa, vítima de doença prolongada. O corpo estará hoje em câmara ardente a partir das 16h00 na Capela Nossa Senhora dos Remédios, em Alfama, donde sairá amanhã às 9h30 para o Cemitério do Alto de São João, onde se realiza o funeral pelas 10h00.
Ana Sofia Rosado
O filho Joaquim Montezuma de Carvalho, também advogado, falou ao JANEIRO do legado do seu pai – “um homem das letras, um filósofo que abominava a política”. Nascido na freguesia de Almedina, em Coimbra, no dia 21 de Novembro de 1928, Joaquim Montezuma de Carvalho licenciou-se em Direito na Universidade de Coimbra. No final dos anos 50, o jovem advogado partiu para Angola. Começou por ajudante de conservador em Nova Lisboa, cidade onde fez carreira nas conservatórias. Chegou a conservador do registo civil e comercial de Lourenço Marques, onde casou com Maria Júlia Neto da Silva, acumulando funções na magistratura. O filho único recorda, desde tenra idade, o gosto do pai pela escrita, pelos escritores e pela literatura, que considerava universal e una. “Não era pessoa de perder tempo a ver televisão ou a ir ao cinema. Os seus temas de conversa à hora da refeição eram um regresso aos escritores”, recorda. Amigo do poeta Jorge Luis Borges, que conheceu na Argentina, do escritor colombiano Gabriel García Marquez e do autor mexicano Octavio Paz, ambos prémios Nobel da Literatura, e de Aquilino Ribeiro, o pensador Joaquim Montezuma de Carvalho gostava de se isolar no meio dos livros, queria ter o essencial e era um homem de gostos muito simples: “O meu pai não se interessava pelas questões monetárias, apesar de ser advogado como eu”. O filho adianta: “Quando ele era novo teve autismo e fechava-se na biblioteca do meu avô, o filósofo e historiador figueirense Joaquim de Carvalho”. De regresso a Portugal, em 1976, exerce advocacia em Lisboa e dá início a uma carreira de escritor e de divulgador da cultura portuguesa. Os seus escritos, que versam sobre literatura, filosofia e história figuram principalmente no estrangeiro.
Colaborador com aprofundados ensaios do «das Artes das Letras» de O Primeiro de Janeiro desde 1999, “todas as segundas-feiras, pedia-me para o tirar da Internet”, recorda. Joaquim Montezuma de Carvalho despertou o interesse do filho por diversos autores. “Eu gostava muito de Júlio Verne, de Camilo Castelo Branco, de Eça de Queirós e ele apresentava-me os grandes autores mundiais”, partilha, lembrando que trocavam frequentemente impressões sobre o que estava a escrever.
Autor de vasta obra no campo do ensaio, Joaquim Montezuma de Carvalho foi distinguido com a Medalha José Vasconcelos, no México, atribuída pela Frente de Afirmación Hispanista, com sede em Nova Iorque, pelo volume «O Panorama das literaturas das Américas». Por ser autor de uma vasta bibliografia consagrada às culturas portuguesa e hispânica, foi designado, em 1999, Cavaleiro da Ordem de S. Eugênio de Trebizonde - de Espanha.
“Defensor da Lusofonia”
A directora do jornal O Primeiro de Janeiro, Nassalete Miranda, recorda que foi pela mão de José Augusto Seabra que Joaquim Montezuma de Carvalho se aliou ao suplemento literário «das Artes das Letras», desde a primeira hora: “Trouxe-nos semanalmente novos escritores e velhos escritores com palavras novas, de todo o mundo. Este é um exemplo de que a literatura não tem fronteiras”. “Defensor a tempo inteiro da Lusofonia”, acrescenta, “trouxe a este suplemento inúmeras vozes da América Latina, das mais conhecidas às que dão agora os primeiros passos, tanto na prosa como na poesia”.»
(in O Primeiro de Janeiro, edição online, 7MAR08)