sexta-feira, 31 de julho de 2009

Durante uns dias estarei de férias, pelo que não publicarei nenhum post. A todos os leitores do Ad Litteram desejo umas boas férias, um bom descanso.
Até qualquer dia!..
(José Amaral)

Leitura para férias

Antes de uma pausa para férias, deixo aqui mais uma sugestão literária. Desta feita trata-se de uma obra do vencedor do Prémio Nobel da Literatura de 2008, Le Clézio. A obra em questão é Deserto (Dom Quixote, 190 páginas). Este livro aborda uma das grandes preocupações de Le Clézio, as condições de vida dos povos nómadas ameaçados de extinção.
Porém, não obstante todas as experiências que usualmente transformam os seus conterrâneos relata a marcha de um exército de maltrapilhos muçulmanos que, com os seus camelos e cavalos, cabras, mulheres e crianças atravessa o deserto da Mauritânia, alguns deles vindos de mais longe ainda, do Sudão ou de Tombuctu, para se juntarem, na cidade santa de Smara, às tropas do sheik Al Maminey que pretende avançar para Norte e atacar os colonialistas franceses que hão-de dízimá-los cruelmente, a soldo de grandes interesses económicos. De entre as personagens mais importantes destacam-se Nour, um rapazinho que vive estas experiências de sede, fome, doença, combate e desilusão; e especialmente Lalla ou Hawa ben Hawa, que se apaixona, ainda adolescente, por um pastorinho semi-selvagem, surdo mudo, que a engravida. Esta menina arisca é levada para Marselha numa leva da Cruz Vermelha Internacional e arruma quartos como empregada doméstica, num hotel de prostitutas e vadios.
Descobre-a um grande fotógrafo, impressionado pela sua beleza exótica, que dela faz uma cover girl. Mas, à beira de expirarem os nove meses da gravidez de Lalla, ela sem se despedir de ninguém, deixa França e uma carreira promissora e regressa à sua terra, para aí, frente ao mar, encostada ao tronco de uma árvore, sozinha, dar à luz a criança tão desejada.
É uma obra interessantíssima, com descrições pormenorizadas que nos fazem acompanhar as viagens destas personagens. Merece uma leitura cuidada. Uma sugestão agradável para as férias.

(José Amaral)

quarta-feira, 29 de julho de 2009

grita

Na senda da divulgação de obras de colegas meus (presentes na comemoração do 25 de Abril de 2009 no Porto), apresento hoje um livro de Lígia Bastos: Grito (Papiro Editora, 203 páginas). A autora é professora e filha do escritor Dário Bastos.
Na contracapa Fátima Silva escreve «Por agora, cumpre-nos apresentar este? Grito? uma obra diferente, revisitada/ressuscitada pela autora, após algum tempo de espera. É que em ?Grito? é uma nova vertente criativa que nos é apresentada - a autora/heroína, de forma bem audível e sentida partilha com o leitor um testemunho vivo - e vivido - de uma época que esperamos não regresse.

(…)
Romance de personagens reais, com alguma pitada de imaginação – sempre necessária na arte da escrita – “Grito” reconduz-nos a um tempo já distante, apresentando-nos problemas sempre presentes, porque intemporais».
No final do livro, contudo, a autora deixa-nos a liberdade de escolher se as personagens são reais, são fictícias ou a mistura de ambas. Serve este livro para reviver esses tempos conturbados do 25 de Abril (antes, durante e um pouco depois). Fica-nos este registo histórico para nos avivar a memória desses outros tempos.

(José Amaral)

segunda-feira, 27 de julho de 2009

jesusalém

No dia 15 de Julho de 2009, Mia Couto apresentou em Viseu, no Salão da Assembleia Municipal, a sua última obra, o romance Jesusalém.
Mia Couto nasceu na Beira, Moçambique, em 1955. Foi jornalista. É professor, biólogo, escritor. Está traduzido em diversas línguas. Entre outros prémios e distinções (de que se destaca a nomeação, por um júri criado para o efeito pela Feira Internacional do Livro do Zimbabwe, de Terra Sonâmbula como um dos doze melhores livros africanos do século XX), foi galardoado, pelo conjunto da sua já vasta obra, com o Prémio Vergílio Ferreira 1999 e com o Prémio União Latina de Literaturas Românicas 2007. Ainda em 2007 Mia foi distinguido com o Prémio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura pelo seu romance "O Outro Pé da Sereia".
Quanto a este seu último romance, “Jesusalém”, lê-se na contracapa que “é seguramente a mais madura e mais conseguida obra de um escritor em plena posse das suas capacidades criativas. Aliando uma narrativa a um tempo complexa e aliciante ao seu estilo poético tão pessoal, Mia Couto confirma o lugar cimeiro de que goza nas literaturas de língua portuguesa. A vida é demasiado preciosa para ser esbanjada num mundo desencantado, diz um dos protagonistas deste romance. A prosa mágica do escritor moçambicano ajuda, certamente, a reencantar este nosso mundo”.
O livro narra-nos a história de Silvestre Vitalício que, após a morte da mulher, Dordalma, se afasta da cidade e do mundo. Num lugar remoto, uma velha coutada, que ele baptiza de Jesusalém, Silvestre vai viver com os filhos Mwanito e Ntunzi, com o fiel Zacarias Kalash e a jumenta Jezibela que era mais que uma jumenta…
É uma obra, a exemplo de outras suas, que se lê com agrada e num fôlego. Uma obra a não perder, uma leitura alegre e agradável para estas férias.

(José Amaral)

sábado, 25 de julho de 2009

Vale a pena ler

No seguimento da publicação de obras de colegas de escrita (do encontro de 25 de Abril de 2009) apresento desta vez um livro de António Sá Gué, Fantasmas de Uma Revolução (Papiro Editora, 172 páginas). Trata-se de uma obra interessante de leitura extremamente cuidada, e “bastante adjectivada” fazendo lembrar a escrita de Valter Hugo Mãe. O livro narra-nos uma história interessantíssima, vivida nos tempos conturbados da revolução. Aqui fica asinopse:
«Poucos terão sido aqueles que, em idade da razão, não tivessem vivido intensamente o período conturbado do PREC, cheio de contradições e acontecimentos marcantes. Nesse tempo, agora só de memórias, as palavras cortavam como facas e a canção era uma inquietante e irónica arma de revolta. Nessa época de liberdade e libertinagem, alegrias e tristezas, de excessos provavelmente frutos da longa noite de escuridão, concatenaram-se numa longa trama de avanços e recuos políticos, podendo muito bem ter culminado na instalação de uma ditadura do proletariado. Ninguém assistiu a tal realidade, ou melhor, só o personagem central do romance a vive. O Alberto Magro e a família, homem a entrar na casa dos “entas”, temente a Deus, ao Marcelo Caetano e aos valores que ele representa, e sem nunca perceber como, se vê injustamente envolvido em prováveis acontecimentos políticos desse tempo ficcionados ao longo de toda a trama. Nessa hipótese aqui aventada, o país muda tanto quanto a personagem central. O Alberto operário têxtil, pressente a mudança. Vai abrir a porta de casa ao seu irmão que regressa das ex-colónias, conotado com o anterior regime, e vai ver-se injustamente enclausurado em Custóias. Após a sua libertação, ao querer salvar o seu próprio irmão, também ele preso num distópico campo de aprendizagem, vai escavando um profundo “buraco” na terra e nele próprio. Forças que não dominam apoderam-se dele e consomem-no à medida que a revolução avança. Nessa lenta metamorfose mirrante, resultante das injustiças em que se vê envolvido e da descrença nos valores em que sempre acreditou, culminará num paradoxal e trágico acontecimento: o enterro no seu próprio buraco.
O país em paralelo, vai-se igualmente transformando, avermelhando, trancando-se sobre si próprio. A litoralização do país a que hoje se assiste não existe, o interior continua como sempre pobre mas povoado».
Este livro merece uma leitura cuidada. Estás de parabéns Sá Gué.

(José Amaral)

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Pausa


Uma pausa para um descanso. Até qualquer dia...
(José Amaral)

terça-feira, 14 de julho de 2009

quissonde

No seguimento da divulgação de obras de colegas de escrita (resultante de um encontro de escritores no dia 25 de Abril de 2009), traga “à luz do Blog” uma obra de Rodrigues Miguel, Quissonde Angola 65/67 (Papiro Editora, 59 páginas). É um relato na primeira pessoa de dois anos passados em Angola, em plena guerra colonial. Uma escrita fluente que nos recorda o que foi o passado, porque, como diz o autor, o mesmo não deve ser apagado. Deve ser recordado, mas evitando os erros.
Aqui fica a sinopse:
«A Guerra Colonial foi travada em África nas então Colónias Portuguesas de Angola, Moçambique e Guiné durante treze longos anos, de 1961 a 1974. Em Angola, teve início no mês de Março de 1961, nos distritos de Zaire, Uige e Quanza Norte, por acção directa da UPA, com violentos e bárbaros massacres de populações brancas e trabalhadores negros de outras etnias, oriundos de outras regiões de Angola. "Quissonde" narra e descreve o decurso de duas operações de uma comissão de dois anos passada em Angola, de 1965 a 1967, na zona de intervenção norte, com um pelotão de Engenharia, que apesar de não ser tropa vocacionada para acções de combate, se viu envolvida em zonas de alto risco».

(José Amaral)

sábado, 11 de julho de 2009

por quatro vezes aqui, no Ad Litteram, sugeri obras de Ken Follet. Maravilhosas!
Por duas vezes “Os Pilares da Terra” (volumes I e II) e “Um Mundo sem Fim” (volumes I e II). Teci os mais rasgados elogios, em particular à primeira obra.
Desta feita, aconselho o novo livro de Ken Follet, O Homem de Sampetersburgo (Bertrand Editora, 350 páginas). Num registo distinto das duas obras atrás referidas, este novo livro não deixa de ser uma pérola literária. Uma excelente leitura de e para férias. Uma leitura que nos prende do princípio ao fim e que quase nos obriga a ler o livro de um fôlego só. É um romance repleto de suspense, luxúria e mentiras. O palco da história é a Londres vitoriana. É simultaneamente um romance sobre um revolucionário russo que viaja até Inglaterra para tentar criar um incidente internacional e uma (despretensiosa) lição de História. Follett apresenta-nos a Alemanha a preparar-se para a guerra e os aliados constroem as suas defesas. Ambos precisam da Rússia. Desenham-se estratégias, cerram-se fileiras. E nisto, o revolucionário russo Feliks chega a Londres com o intuito de cometer um crime que haveria de mudar o curso da História. Muitas são as armas que este mestre da manipulação tem nas suas mãos, mas as mais perigosas são o amor de uma mulher inocente e a paixão insaciável de outra. Contra si erguem-se as forças policiais britânicas, um lorde abastado e influente e o jovem Winston Churchil. Qualquer homem teria sido detido, com excepção do homem de Sampetersburgo…
Aqui fica a sinopse:
«1914: a Alemanha prepara-se para a guerra e os aliados constroem as suas defesas. Ambos os lados precisam da Rússia. O Duque de Walden e Winston Churchill planeiam, em total segredo, uma aliança russa mas um homem infiltra-se em Inglaterra com a intenção de deixar a sua marca na História e deixar o país a seus pés...»

Quem não ler... não sabe o que perde!...

(José Amaral)

quarta-feira, 8 de julho de 2009

infelicidades


MendicânciA


Faz-se fria a noite, na rua.
Eis que me encontro, aqui,
no aconchego palaciano do meu quarto,
qual poderoso rei mendigando as ruas
- salivadas, cuspidas, escarradas,
pelos janotas engravatados -,
àqueles a quem pertencem.

A frialdade nocturna,
repentinamente, deu lugar
a uma copiosa chuva torrentosa,
que me deixou louco de desejo
de resguardar o mundo
com um gigante guarda-chuva,
dessa pluviátil ameaça.
Estava nervoso!
Comia deleitosamente cigarros
como quem fuma, asquerosamente,
cerejas umas atrás das outras.

Voltei à minha palaciana mendicância.

Mendiguei as pedras paralelepipédicas,
gélidas e amargas,
a quem delas se alimenta
e retira o conforto que só se esbanja
em luxuosas casas.
Ali, na rua de todos,
só os pobres conseguiriam sobreviver
agarrados à miséria
e aos olhares doestos
daqueles que se julgam superiores.
Ali, na rua de todos,
só os ricos conseguiriam perder
não só a dignidade,
assi como a faustosa vida
que seus envidraçados palácios
encobrem desavergonhadamente.

Ali, na rua de todos,
o fidalguia mistura-se, a medo,
com a gentalha numa quasi igual disputa.

Na rua – simplesmente a rua -
os “corpos despidos de alma”
(serão gente?)
vivem o isolamento da multidão
que passa, apressada, ao largo
e nem sequer se digna cruzar
o seu comiserador olhar,
(com medo de ferir a menina dos olhos)
com o empobrecido olhar
daqueles que lhe estendem
a mão migalhando esmolas.

(...)

Anos passaram!
Pedintes nasceram, morreram
e a cidade continuou, indiferente,
às mãos estendidas dos pedintes.


(José Amaral, in "Poder da Díctamo")

domingo, 5 de julho de 2009

No dia 25 de Abril de 2009 participei numa sessão comemorativa desta data, no Porto, com outros companheiros de escrita. Entre eles encontrei Fernando Mascarenhas. A conversa entre ambos foi curta, mas interessante. No final do evento adquiri, deste autor amigo, o livro Cafeína (Papiro Editora, 274). É um livro que se lê com agrado redobrado. Uma escrita solta para uma leitura agradável. Na forma como o Fernando reverte as ideias em escrita, pude constatar a excelente pessoa que ele é. Fica, ainda, a informação de que o autor doou os Direitos de Autor à AMI.
Aqui fica a sinopse:
«A geração de 60 nos anos 70. Um mundo fechado. Um país atrasado. Salazar, a “Primavera Marcelista”, o 25 de Abril. Os anos de brasa. O adeus a África. A Descolonização e o PREC (Processo Revolucionário em Curso). O mundo empresarial e político. A emancipação da mulher. O primeiro abanão nos fundamentos da Família Tradicional. A complexidade das relações e dos sentimentos. O sexo, o amor e a morte».
Parabéns, Fernando!

(José Amaral)

sexta-feira, 3 de julho de 2009

poema


Olhares


Tinha um brilho triste
nos olhos,
sempre,
aquele cachorrinho rafeiro.

Não seria antes o dono?

Ambos
(parecendo escoteiros de rua)
viviam da misericórdia
anónima dos passantes,
poisque partilhavam
as pedras da calçada
calcorredas
pelas gentes que passam.

O rafeiro
ainda recebia
- abanando a cauda –
festinhas na cabeça;
o humano
- sorrindo –
recebia…
… olhares de soslaio!!!


(José Amaral, in "Outonalidade")