RestolhO
Era noite.
Noite de breu medonho.
Acometia a nossa pequeneza.
Caminhávamos, passos periclitantes,
através dos atalhos dos campos.
Atravessámos um restolho.
A lua, alta, começou a vislumbrar-se,
e, foi quando, ao largo,
ressaltou o restolho,
negro, ao luar.
O trigo fora já cortado;
naquele campo – que outrora
fora um mar dourado –
apenas, e só, algumas espigas caídas
deixadas ao abandono,
prenhes de sementes,
esperando que alguma pobre viúva
as viesse recolher em seu regaço,
ou quiçá,
algum animal as transportasse
para servirem
de lauto sustento
aos seus rebentos.
Ao largo do restolho,
do lado direito,
árvores – penso que choupos,
quais guardiões –
demasiado esguias e esbeltas,
estrategicamente posicionadas,
guardavam o seu tesouro.
Os campos cheiravam
a rosmaninhos;
os grilos entoavam
uma melodia monocórdica
que se “espraiava”
ao longo do restolho.
De repente,
um pio, horripilante,
de um mocho
acordou a noite.
Fez-nos avivar o passo
e atravessar, quasi a correr...
...o restolho.
in Poder da Díctamo, José Amaral
2 comentários:
Realmente........o medo por vezes apodera-se das pessoas e faz com que se cometam autenticas loucuras.
Boa...o pio horripiliante de um mocho(pássaro com uma positiva carga simbólica!) acordou a noite!
leio como o despertar da consciência...perante o negrume..o nada!Gostei das metáforas!
B.
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