HISTÓRIA ANTIGA
Era uma vez, lá na Judeia, um rei.
Era uma vez, lá na Judeia, um rei.
Feio bicho, de resto:
Uma cara de burro sem cabresto
E duas grandes tranças.
A gente olhava, reparava, e via
Que naquela figura não havia
Olhos de quem gosta de crianças.
E, na verdade, assim acontecia.
Porque um dia,
O malvado,
Só por ter o poder de quem é rei
Por não ter coração,
Sem mais nem menos,
Mandou matar quantos eram pequenos
Nas cidades e aldeias da Nação.
Mas,
Por acaso ou milagre, aconteceu
Que, num burrinho pela areia fora,
Fugiu
Fugiu
Daquelas mãos de sangue um pequenito
Que o vivo sol da vida acarinhou;
E bastou
Esse palmo de sonho
Para encher este mundo de alegria;
Para crescer, ser Deus;
E meter no inferno o tal das tranças,
Só porque ele não gostava de crianças.
(Miguel Torga, in Antologia Poética, Coimbra, Ed. do Autor, 1981)
6 comentários:
UM excelente poema do grande "Torga"!
Bem haja pela correccao!
Um abraco de amizade.
Al Cardoso
Torga e sempre Torga. A sua poesia enche-nos a alma e revigora-nos o espírito (não só o natalício).
Bom fim-de-semana
Abraço
Caro Amaral
Estive a ler há dias este poema do Torga, e mais uma vez nos encontramos. Mas este Torga, poucos o conhecem. A rudeza não deixa adivinhar "isto"... o homem da aridez e das mãos calejadas.
Um abraço
Meg
Sem sombra de dúvida. Um Torga (raiz) tão rude de mãos com enxada e tão subtil de mãos com a pena.
Abraço
Grande Torga.
Este foi um dos primeiros poemas que decorei e recitei em miúda ...
beijinhos
Isabel
Que bela escolha a tua.Realmente é um poema belíssimo.
Bom fim-de-semana
Bjo
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