Leio o teu nome
Na página da noite:
Menino Deus... E fico a meditar
No milagre dobrado
De ser Deus e menino.
Em Deus não acredito.
Mas de ti como posso duvidar?
Todos os dias nascem
Meninos pobres em currais de gado.
Crianças que são ânsias alargadas
De horizontes pequenos,
Humanas alvoradas...
A divindade é o menos.
Miguel Torga
Poema de Natal
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos
—Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos
—Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai
—Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte
—De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Vinicius de Moraes
2 comentários:
Vinicius...sempre com uma sensibilidade inigualável,concerteza que só podia ter sido uma pessoa encantadora...
Encantadora e muito humana. Feliz Natal
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