sexta-feira, 27 de junho de 2008

Poema


ocaso

O entardecer crepusculino
trazia-me uma paz de espírito,
que nem sei bem
como explicar.
Debaixo de uma araucária,
lendo um livro,
vislumbrava
uma araneífera roseira.
Um pavão macho,
de bela plumagem,
levantava em leque
a cauda
e parecia refrescar-me
a leitura.
E era assim que,
dia-após-dia,
o crepúsculo da vida
- aterrador -
se fazia anunciar.



(in “Oráculo Luminar”, José Amaral)

domingo, 22 de junho de 2008

Ao Verão


Amapolas


Amigo…

En el cielo,
donde crecen
amapolas centellantes
como perlas,
la noche empieza a desnudarse.

Al ponerse el sol
todas las aves
cantan melodías en sus nidos.

Vosotros quedáis solitarios!

Tinieblas soñadoras
por entre las nubes
guardan en su corazón
las claras mañanas.

Cuando renace la aurora
las amapolas,
que a la brisa ondean,
sueñan con suaves besitos
del rocío
e
vosotros quedáis solitarios
entre las hojas de hierba
de los campos.


(in "Outonalidades", José Amaral)

sábado, 21 de junho de 2008

Eu gosto é do Verão...

Hoje, 21 de Junho, começa o Verão (chamado solstício de Verão). Isto é, hoje é o dia mais longo do ano e a noite é menor. Porquê? Porque em astronomia, solstício é o momento em que o Sol, durante o seu movimento aparente na esfera celeste, se afasta mais da terra.
O engraçado da questão é que no
hemisfério norte o solstício de Verão ocorre no dia 21 de Junho, e o solstício de Inverno ocorre no dia 21 de Dezembro. Em contraponto, no hemisfério sul é o contrário.
Com o Verão é necessário haver muito mais cuidado com o Sol. E, numa altura em que tanto se fala de cancro é necessário protegermo-nos.
A todos um Verão risonho!...

(José Amaral)

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Multifacetado

Francisco Buarque de Hollanda, mais conhecido como Chico Buarque nasceu no Rio de Janeiro, a 19 de Junho de 1944. É um dos mais afamados músicos, dramaturgos brasileiros. Como escritor ainda não conseguiu o estrelato. O seu livro “Budapeste” (que já li) não foi muito aclamado pela crítica, embora tenha ganho o Prémio Jabuti. A sua Ópera do malandro é conhecida mundialmente. Tive a oportunidade de vê-la, há dois anos, no Coliseu do Porto e é realmente um espectáculo fabuloso. A sua poesia também ganha força através das suas músicas. Aqui fica um exemplo:

Valsinha

Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar

Olhou-a de um jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar
E não mal disse a vida tanto quanto seu jeito de sempre falar
E não deixou-a só num canto, pra seu grande espanto convidou-a pra rodar

Então ela se fez bonita como a muito tempo nào queria ousar
Com seu vestido decotado cheirando a guardado de tando esperar
Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça foram para praça e começaram a se abraçar

E ali dançaram tanta dança que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade que toda a cidade se iluminou
E foram tantos beijos loucos, tantos gritos roucos como não se ouviam mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu
Em paz


(José Amaral)

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Eugénio

Eugénio de Andrade (pseudónimo de José Fontinhas Rato) nasceu na freguesia de Póvoa de Atalaia (Fundão) a 19 de Janeiro de 1923 e faleceu no Porto a 13 de Junho de 2005 (após doença prolongada). Viveu em Lisboa, Coimbra e Porto. Travou amizade com muitas personalidades da cultura portuguesa: Miguel Torga, Carlos Oliveira, Eduardo Lourenço, Sophia de Mello Breyner Andresen, Teixeira de Pascoaes, Vitorino Nemésio, Jorge de Sena, Mário Cesariny… Eugénio era pouco dado a aparições públicas e vivia distanciado da chamada vida social. Aqui fica um belíssimo poema de Eugénio:

AS AMORAS

O meu país sabe as amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.


(José Amaral)

120 anos de Pessoa

Fernando Pessoa nasceu em Lisboa, a 13 de Junho de 1888 e faleceu também na capital portuguesa a 30 de Novembro de 1935. É considerado um dos maiores poetas de língua portuguesa. Na literatura desdobrou-se em várias outras personalidades conhecidas como heterónimos. A figura enigmática em que se tornou movimenta grande parte dos estudos sobre sua vida e obra, além do fato de ser o maior autor da heteronímia. Este ano comemoram-se os 120 anos do seu nascimento. Aqui fica um dos mais conhecidos poemas de Pessoa:


Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira a entreter a razão,
Esse comboio de corda
que se chama o coração.


(José Amaral)

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Poesia para o fim-de-semana

Konstantin Dmitrievich Balmont nasceu a 15 de Junho de 1867 e faleceu a 24 de Dezembro de 1942. Este poeta foi uma das maiores figuras da Idade de Prata da Poesia Russa.
Infelizmente não consegui um poema deste autor em Português, mas este italiano compreende-se.


IO VENNI AL MONDO PER VEDERE IL SOLE
Io venni al mondo per vedere il sole
e gli azzurri orizzonti.
Io venni al mondo per vedere il sole
e i bianchi monti.
Io venni al mondo per vedere il mare
e il verde oro del piano.
Più mondi in uno sguardo io so serrare:
sono un sovrano.
Io vinsi lo squallore dell'oblio
col mio incanto.
In me si cela eternamente un dio
e sempre canto.
Svegliato fu il mio sogno dal dolore
e in terra mi ama ognuno.
Chi pari m'è nelle virtù canore?
Alcuno, alcuno!
Io venni al mondo per vedere il sole
e all'imbrunire
io canterò… Io canterò del sole
nell'ora di morire.


Mihail Eminescu nasceu em Botoşani, a 15 de Janeiro de 1850 e faleceu em Bucareste, a 15 de Junho de 1889. Foi o mais importante e conhecido poeta da literatura romena.
Escreveu muito e graças a
Iacob Negruzzi, publicou os seus primeiros versos na revista Junimea. Foi por algum tempo actor, inspector de escolas e bibliotecário em Iaşi, onde conheceu Veronica Micle, sua inspiradora, e seu grande amor.


Foram-se os anos ...

Foram-se os anos como as nuvens vão
E nunca mais retornarão um dia;
Já não me encantam hoje, como então,
Lendas e doinas*, sons da fantasia

Que à mente de um menino foram graças
Mal compreendidas, cheias de um alarde –
Com tuas sombras hoje em vão me abraças,
Ó hora do mistério, ao fim da tarde.

Para arrancar um som do meu passado,
Para fazer-te, ó alma, ainda vibrar,
A mão em vão a lira tem tocado.

Perdeu-se tudo na alba do lirismo,
Calou-se a voz do outrora sublimado,
O tempo cresce em mim... e eu me abismo!

(* Doina: canção popular entranhável e melancólica, a mais viva expressão da alma romena, segundo o poeta Vasile Alecsandri. Tradução: Luciano Maia)


(José Amaral)

terça-feira, 10 de junho de 2008

Queres fiado...

A 12 de Junho de 1875 (n’A Lanterna Mágica) Rafael Bordalo Pinheiro “dava à luz” o Zé Povinho, personagem de crítica social adoptada como personificação nacional portuguesa.
Tem como característica principal o gesto do manguito (por vezes acompanhado da frase “Queres fiado, toma!”), representando a sua faceta de revolta e insolência. O Zé Povinho (como se deduz) refere-se ao povo português, criticando de uma forma humorística muitos dos problemas sociais e políticos da sociedade portuguesa. Além disso, é uma caricatura do povo português na sua característica de eterna revolta perante o abandono e esquecimento da classe política, embora pouco ou nada fazendo para alterar a situação.
Nos dias que correm, conturbados e de agitação, é necessário descruzar os braços e mostrar a revolta que nos vai na alma. Quiçá, seja necessário, também, fazer o manguito como forma de protesto.

(José Amaral)

domingo, 8 de junho de 2008

O Prazer da leitura...

Mais uma sugestão de leitura e novamente de um escritor português de renome: Ramalho Ortigão. A obra, ainda da colecção Grandes Autores Portugueses (colecção 120 anos JN), desta feita é Histórias Cor-de-rosa. Também desta vez lamento a letra miudinha de um saboroso livrinho de 79 páginas. São pequenas, mas deliciosas histórias escritas num estilo muito sóbrio donde se destaca o sentido crítico do autor, bem como o austerismo e ao mesmo tempo a delicadeza da escrita de Ramalho.
Ramalho Ortigão nasceu no Porto onde viveu com sua avó materna, depois de frequentar o curso de direito, que não completou, dedicando-se ao jornalismo. Envolveu-se na “Questão Coimbrã” e acabou a enfrentar Antero de Quental num duelo de espadas, devido à sua ligação profissional com o romantismo que dominava as letras. Contudo, mais tarde veio a ser uma das principais figuras da “Geração de 70”. Construiu uma sólida amizade com Eça de Queirós.

(José Amaral)

terça-feira, 3 de junho de 2008

Feira do Livro - Porto - 2008

No dia 7 de Junho de 2008, pelas 21:00 horas, estarei presente na Feira do Livro do Porto (a convite da Papiro Editora) num "Encontro de Poetas". É sempre uma oportunidade para rever amigos e para adquirir alguns livros a preços mais convidativos.
A todos os visitantes/amigos do Ad Litteram que queiram e possam estar presentes aqui fica o meu convite. Muito me honraria a vossa presença.
Apareçam e tragam um amigo!

(José Amaral)

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Poema

Negra

Naquela pueril
face negra
aqueles
dois olhos grandes,
brancos,
lembram
os pólos
imaculadamente pacíficos.

O sorriso,
branco,
daquela pueril
face negra
lembra
a inocência
desta criança
que sorri
à pobreza
e às armas.

(in “Outonalidades”, José Amaral)

domingo, 1 de junho de 2008

"Menina e Moça"

Menos tempo disponível, e mais trabalho acrescido, não é sinónimo de não-leitura. Desta feita acabei de ler Menina e Moça, romance de Bernardim Ribeiro (Colecção 120 anos JN, 95 pág.). Esta edição tem a particularidade de estar escrita com o Português à época de Bernardim (século XV? – antes de 1557?), e só é pena estar grafado com uma letra muito miudinha.
Estamos na presença de uma obra, incompleta, de índole sentimental. A natureza aparece como “culpada” do estado de alma. Nesta obra encontramos uma comum nostalgia amorosa e o fatalismo do sofrimento (ex. Aónia e Bimuarder, Arima e Avalor), bem como constantes desencontros amorosos.
Vale a pena ler esta obra (fundamentalmente destinada a alunos do ensino secundário), pois trata-se de uma perturbante e enigmática obra.

(José Amaral)