segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Não à violência...

É já a 30 de Janeiro que se celebram os 60 anos da morte de Mohandas Karamchand Gandhi, mais conhecido por Mahatma Gandhi. Este activista/pacifista (cujo nome significa "A Grande Alma") nasceu a 2 de Outubro de 1869 em Nova Deli, e faleceu a 30 de Janeiro de 1948. Fez uma revolução, usando o princípio da não-violência, que ajudou a fundar o moderno estado indiano.
Estudou Direito em Londres e tornou-se vegetariano. Para Gandhi a alimentação deve ser apenas a suficiente para satisfazer as necessidades do corpo, por isso jejuava e usava o jejum frequentemente como estratégia política (uma espécie de greve de fome). Também no que ao sexo respeita Gandhi tinha uma ideia própria, baseada e influenciada pela crença hindu, e foi nesse pressuposto que renunciou ao sexo aos 36 anos. O silêncio era para ele importante e um dia por semana abstinha-se de falar; comunicava escrevendo.
Gandhi ia mais longe e, depois de regressar de África do Sul, começou a vestir-se de forma mais pobre. Fabricava artesanalmente os
tecidos da sua própria roupa e usava esses tecidos nas suas vestes.
Gandhi era contra o sistema convencional de
Educação em Escolas, acreditava que as crianças aprendem mais com os pais e com a sociedade.
Por várias vezes Gandhi foi indicado para o
Prémio Nobel da Paz, mas nunca o recebeu, embora o comité organizador tenha reconhecido ter sido um erro.
Muitas foram as opiniões sobre Gandhi.
Winston Churchill chegou a chamá-lo de "faquir nu" e Albert Einstein disse que “as gerações futuras terão dificuldade em acreditar que um homem como este realmente existiu”.

Aqui ficam alguns dos pensamentos de Gandhi:
"De olho por olho e dente por dente o mundo acabará cego e sem dentes."
"Só podemos vencer o adversário com o amor, nunca com o ódio."
"O medo tem alguma utilidade, mas a covardia não."
"A verdadeira riqueza de um homem é o bem que ele faz ao seu semelhante."
"A arte da vida consiste em fazer da vida uma obra de arte."
"Divergência de opinião jamais deve ser motivo para hostilidade."


(José Amaral)

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

E esta hein?...

«Sondagem
Portugueses confiam mais nos professores
Políticos estão em último lugar das preferências
A profissão de professor é aquela em que os portugueses mais confiam e também aquela a quem confiariam mais poder no país, segundo uma sondagem mundial efectuada pela Gallup para o Fórum Económico Mundial (WEF).
Os professores merecem a confiança de 42 por cento dos portugueses, muito acima dos 24 por cento que confiam nos líderes militares e da polícia, dos 20 por cento que dão a sua confiança aos jornalistas e dos 18 por cento que acreditam nos líderes religiosos. Os políticos são os que menos têm a confiança dos portugueses, com apenas sete por cento.
Os portugueses privilegiaram também os professores enquanto profissão a que dariam mais poder no país (32 por cento), seguindo-se os intelectuais (28 por cento) e os dirigentes militares e policiais (21 por cento), surgindo em último lugar, com seis por cento, as estrelas desportivas ou de cinema.
A confiança dos portugueses por profissões não se afasta dos resultados médios para a Europa Ocidental, onde 44 por cento dos inquiridos confiam nos professores, seguindo-se os líderes militares e policiais, com 26 por cento.
Os advogados, que em Portugal apenas têm a confiança de 14 por cento dos inquiridos, surgem em terceiro lugar na Europa Ocidental, com um quarto dos europeus a darem-lhes a sua confiança, seguindo-se os jornalistas, que são confiáveis para 20 por cento. Em último lugar na confiança voltam a estar os políticos, com 10 por cento.
A nível mundial, os professores são igualmente os que merecem maior confiança, de 34 por cento dos inquiridos, seguindo-se os líderes religiosos (27 por cento) e os dirigentes militares e da polícia (18 por cento). Uma vez mais, os políticos surgem na cauda, com apenas oito por cento dos 61.600 inquiridos pela Gallup, em 60 países, a darem-lhes a sua confiança».

(in Jornal de Notícias, edição on-line 25JAN08)


Ora aqui está uma daquelas notícias que, embora nada venha a alterar, me enche o ego e me orgulha. É pena que os nossos políticos não a leiam com olhos de ver. É pena que o Ministério da Educação não faça parangonas com esta notícia. É, mais provável, que alguns iluminados venham a descobrir que foram, apenas, os professores a votar. Mas não é só em Portugal, é na Europa e no Mundo.
E os políticos? Em último? Sim, sim em último.
Vale a pena pensar nisto! É aquilo a que o povo chama “chapada de luva branca”

(José Amaral)

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Miniconto Criminal

Para ilustrar o que disse no post anterior e para que o leitor possa fazer o seu juízo próprio aqui deixo o conto n.º 20 do livro de Cláudio Feldman: Caim & Cia Ilimitada. Embora não sendo o conto que mais gostei, por razões mais ou menos óbvias (atente-se no título) escolhi o miniconto:
O Crime do Pardo Amaro

«Clarissa, filha do hoteleiro, 16 anos de curvas, estava rematando os trabalhos domésticos, em seu quarto, quando Amaro escalou furtivamente a janela do hotel “Chic”, e penetrou na intimidade da garota, disposto a ter com ela relações ilícitas, como dizem certos jornais “éticos”. Clarissa, reagindo contra os desejos libidinosos de Amaro, estabeleceu com ele violenta luta e, na certeza de ser dominada, já na cama, conseguiu deitar mão no revólver de seu pai e detonou-o. Era a última bala e seria o último crime do pardo Amaro, se o projéctil não desviasse para a rua».

(José Amaral)

Pequena Maravilha

Recebi hoje um pequeno livrinho (69 páginas) do meu amigo, o poeta Cláudio Feldman. A obra em causa Caim & Cia Ilimitada (Editora Taturana, 2ª edição) lê-se em meia hora. Trata-se de um livro de minicontos criminais (alguns têm apenas duas ou três linhas), mas nem por isso deixa de ser um grande livro. Este livro, escrito por Cláudio quando tinha trinta e seis anos, é uma pequena preciosidade. As histórias, com um humor muito próprio, são excelentes.
Além do mais, cada história está fenomenalmente bem ilustrada.
Como diz Moacyr Scliar no prefácio «Quer dizer: a carga dramática de um conto independe de sua extensão. Cláudio Feldman sabe disto. É a síntese que ele persegue, em suas histórias ultra-curtas -síntese associada a um humor cortante, surpreendente. Neste mundo que tem pressa, Cláudio Feldman não demora a dar o seu recado. E o faz com economia e precisão».
Provavelmente poucos terão ouvido falar deste escritor – embora o seu currículo seja vastíssimo – e é pena. Merecia ser divulgado em Portugal.

(José Amaral)

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Poema

George Gordon Byron, mais conhecido por Lord Byron nasceu em Londres, a 22 de Janeiro de 1788 e faleceu em Missolonghi, a19 de Abril de 1824. Este poeta britânico é uma das figuras mais influentes do Romantismo é mesmo considerado um dos maiores poetas europeus.
Este poeta extravagante levou uma vida conturbada que inclui numerosas
amantes, dívidas, separações, alegações de incesto e uma eventual morte por febre
Aqui fica, no original, um poema seu:

She Walks In Beauty

She walks in beauty, like the night
Of cloudless climes and starry skies;
And all that's best of dark and bright
Meet in her aspect and her eyes:
Thus mellowed to that tender light
Which heaven to gaudy day denies.
One shade the more, one ray the less,
Had half impaired the nameless grace
Which waves in every raven tress,
Or softly lightens o'er her face;
Where thoughts serenely sweet express
How pure, how dear their dwelling-place.
And on that cheek, and o'er that brow,
So soft. so calm, yet eloquent,
The smiles that win, the tints that glow,
But tell of days in goodness spent,
A mind at peace with all below,
A heart whose love is innocent.


(José Amaral)

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

"Desfolhando poesia..."

Ary dos Santos natural de Lisboa, onde nasceu 7 de Dezembro de 1936 e faleceu a 18 de Janeiro de 1984, saiu de casa aos 16 anos. Exerceu diversas actividades para sobreviver.
Foi um garnde
poeta português e diseur de poesia. Filia-se no PCP e participa em muitas sessões de poesia. Ficou também conhecido como autor de poemas para canções do Concurso da Canção da RTP. Os seus temas «Desfolhada» (1969, interpretada por Simone de Oliveira) e «Tourada» (1973, interpretada por Fernando Tordo) saíram ambos vencedores.
Ary dos Santos foi uma personalidade irreverente e cativante. Uma grande maioria dos seus textos tem um forte tom satírico. A sua irreverência está bem presente neste seu poema:



Poeta castrado não!

Serei tudo o que disserem

por inveja ou negação:

cabeçudo dromedário

fogueira de exibição

teorema corolário

poema de mão em mão

lãzudo publicitário

malabarista cabrão.

Serei tudo o que disserem:

Poeta castrado não!

Os que entendem como eu

as linhas com que me escrevo

reconhecem o que é meu

em tudo quanto lhes devo:

ternura como já disse

sempre que faço um poema;

saudade que se partisse

me alagaria de pena;

e também uma alegria

uma coragem serena

em renegar a poesia

quando ela nos envenena.

Os que entendem como eu

a força que tem um verso

reconhecem o que é seu

quando lhes mostro o reverso:

Da fome já não se fala

- é tão vulgar que nos cansa -

mas que dizer de uma bala

num esqueleto de criança?

Do frio não reza a história

- a morte é branda e letal -

mas que dizer da memória

de uma bomba de napalm?

E o resto que pode ser

o poema dia a dia?

- Um bisturi a crescer

nas coxas de uma judia;

um filho que vai nascer

parido por asfixia?!

- Ah não me venham dizer

que é fonética a poesia!

Serei tudo o que disserem

por temor ou negação:

Demagogo mau profeta

falso médico ladrão

prostituta proxeneta

espoleta televisão.

Serei tudo o que disserem:

Poeta castrado não!



(José Amaral)

Sugestão Literária

Acabei de ler o novo Romance de Gonçalo M. Tavares: “Aprender a rezar na Era da Técnica” (Caminho, 383 pág.).
Este livro encerra a tetralogia "O Reino", mas confesso que, nesta primeira leitura, não me seduziu grandemente. Talvez requeira uma segunda leitura!...
Não que não esteja bem escrito. Está! Não que não tenha uma história interessante. Tem! Mas… parece faltar qualquer coisa que nos prenda à leitura e que nos faça lê-lo (e relê-lo) de um só fôlego como foi com “Jerusalém”.
Este Romance conta-nos a história de Lenz Buchmann, um homem atroz. Como médico despreza os doentes, como político despreza a sociedade, como marido despreza e humilha a mulher (chega ao ponto de fazer amor à frente de um pedinte com a mulher), como cidadão despreza os sem-abrigo (chega ao ponto de obrigar o pedinte a implorar-lhe comida)…
Buchmann decide trocar a medicina pela política, mas envereda por caminhos pouco claros. Entretanto, Buchmann adoece e vemos como este homem poderoso lida com a doença até ao momento final, o momento da sua decadência.
Talvez por ser um Romance sobre a natureza humana e política seja difícil gostar-se logo à primeira. No entanto, não deve, de todo, ser colocado de lado. Deve ser-lhe dado o benefício da dúvida.

(José Amaral)

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Quem és tu?


carrasco


Quem és tu,
carrasco maldito,
que escavas
sete palmos de terra
e que depois
os aconchegas
às tábuas
do meu caixão?

Dá-te prazer?
É-te difícil?

Não invejo a tua sorte,
contudo peço-te
um favor:
atira brandamente
a terra para cima
do meu esquife.

Obrigado!


(in “Oráculo Luminar”, José Amaral)

sábado, 12 de janeiro de 2008

Poema

A morte absoluta
Morrer.
Morrer de corpo e de alma.
Completamente.

Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão - felizes! - num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.
Morrer sem deixar porventura uma alma errante...
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?

Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança de uma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento,
Em nenhuma epiderme.
Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: "Quem foi?..."

Morrer mais completamente ainda,
- Sem deixar sequer esse nome.

(Manuel Bandeira)

"Aprende a viver e saberás morrer bem."
(Confúcio)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Nobel

Gabriela Mistral nasceu em Vicuña (Chile), a 7 de Abril de 1889 e faleceu em Nova Iorque, a 10 de Janeiro de 1957.
Poetisa, educadora, diplomata e feminista chilena, vencedora do Prémio Nobel da Literatura em 1945.
Aqui fica um belíssimo poema desta autora:

NOCHE



Las montañas se deshacen,
el ganado se ha perdido;
el sol regresa a su fragua:
todo el mundo se va huido.

Se va borrando la huerta,
la granja se ha sumergido
y mi cordillera sume
su cumbre y su grito vivo.

Las criaturas resbalan
de soslayo hacia el olvido,
y también los dos rodamos
hacia la noche, mi niño.

(José Amaral)

Vale a pena ver

Ontem fui ver um filme que merece que aqui o destaque: Jogos de Poder. Este filme que mais não fosse conta com as maravilhosas interpretações de três artistas que já venceram o Óscar: Tom Hanks, Julia Roberts e Philip Seymour Hoffman.
O filme conta-nos a realidade vivida no Afeganistão na altura em que foi invadido – plena guerra.fria – pela União Soviética.
A história gira em torno do congressista solteiro e bon-vivant Charlie Wilson (Hanks), sempre rodeado de mulheres e com um copo de whisky na mão, uma VIP de Houston (Joanne – Julia Roberts) e um agente da CIA (Gust Avrakotos – Philip Hoffman) que procuram arranjar verba para armar os afegãos (os mujahedeen) com a finalidade de derrotarem os russos. Esta operação, contudo, mantém-se secreta.
Os três vão viajar pelo mundo para conseguir apoio (uma aliança a nível dos vários quadrantes) de paquistaneses, israelitas, egípcios para derrubarem o inimigo comunista.
O filme vale no seu todo pela história, pelo desempenho dos três principais intervenientes e pelos diálogos carregados de um humor refinadíssimo entre Charlie e Gust.

(José Amaral)

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Poemas

O bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.

(Manuel Bandeira)


60 Anos

Antes o dia continha seu próprio significado
Hoje
Miro coisas que não entendo - leis turvas
E rostos ilegíveis -
A vida
Varre os domingos
Para os jardins pretéritos

O rumo se perdeu
Na desordem das águas
Por isto
Meus ossos rangem
À mutação das coisas e seu desígnio

(Cláudio Feldman)

Poema do jornal

O fato ainda não acabou de acontecer
e já a mão nervosa do repórter
o transforma em notícia.
O marido está matando a mulher.
A mulher ensanguentada grita.
Ladrões arrombam o cofre.
A polícia dissolve o meeting.
A pena escreve.

Vem da sala de linótipos a doce música mecânica.

(Carlos Drummond de Andrade)

Quero escrever o borrão vermelho de sangue

Quero escrever o borrão vermelho de sangue
com as gotas e coágulos pingando
de dentro para dentro.
Quero escrever amarelo-ouro
com raios de translucidez.
Que não me entendam
pouco-se-me-dá.
Nada tenho a perder.
Jogo tudo na violência
que sempre me povoou,
o grito áspero e agudo e prolongado,
o grito que eu,
por falso respeito humano,
não dei.

Mas aqui vai o meu berro
me rasgando as profundas entranhas
de onde brota o estertor ambicionado.
Quero abarcar o mundo
com o terremoto causado pelo grito.
O clímax de minha vida será a morte.

Quero escrever noções
sem o uso abusivo da palavra.
Só me resta ficar nua:
nada tenho mais a perder.

(Clarice Lispector)

domingo, 6 de janeiro de 2008

Herança literária

Terminei 2007 a ler Sándor Márai (“A mulher Certa”) e começo 2008 a lê-lo de novo – a primeira sugestão de leitura de 2008, que aqui apresentei, reporta-se às férias. Este livro de Sándor Márai, A Herança de Eszter (Dom Quixote, 152. Pág), lê-se num fôlego (em três horitas) e com muito entusiasmo.
Conta-nos a história de um amor. Poderia ser um amor como tantos outros, mas não é. A personagem principal, Eszter, é quem nos conta essa história. Depois de “perder” o homem da sua vida (Lajos) para a sua irmã Vilma, Eszter viveu uma vida sombria e monótona à espera da morte.
Lajos era um mentiroso compulsivo e enganou Eszter, não só esta mulher, mas todos os que o rodeavam. Para ele, contrair dívidas era tão natural como respirar.
Passados vinte anos Lajos envia um telegrama a Eszter e esta acaba por recebê-lo em sua casa. Esse encontro serve para reviver o passado. Lajos (um sedutor sem escrúpulos, um canalha) além de trair Eszter rouba-lhe tudo. Neste seu regresso consegue novamente enrolar Eszter e esta deixa-se embalar pelas palavras mansas de Lajos…

O AD LITTERAM deixa aqui um excerto:


«Enquanto me vestia, frente ao espelho, fui obrigada a apoiar-me; tive uma visão. Vi o passado, mas com a força com que se vê a realidade do presente. Vi o jardim, o mesmo jardim, onde, agora, esperávamos Lajos – estávamos debaixo do enorme freixo, vinte anos mais novos, e os nossos corações enchiam-se de desolação e ira. Voavam pelos ares palavras fortes e coléricas, quais moscardos outonais. Era também Outono, em finais de Setembro. O ar perfumava-se, vaporoso».

(José Amaral)

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

1ª sugestão literária 2008

No dealbar deste novo ano – 2008 – retomo as minhas partilhas literárias. Acabei o ano a sugerir uma bela obra do húngaro Sándor Márai. E como primeira proposta deste novo ano sugiro Palavras e Sangue (Clássicos da Literatura, 215 pág., numa edição exclusiva para os hipermercados Modelo) de Giovanni Papini. Este escritor italiano nasceu a 9 de Janeiro de 1881, em Florença, e faleceu nessa mesma cidade a 8 de Julho de 1956. É um autor controverso, mas afirma-se por ser um escritor vanguardista.
Este seu Palavras e Sangue é um conjunto de conto, escrito de forma sublime, que nos fazem pensar nos mais diversos problemas da Vida e do Pensamento. É um livro que nos faz pensar em tantas verdades adormecidas nos nossos “eus” que por vezes temos medo de destapar. Este livro de vinte e quatro pequenos contos (dos quais destaco “O Prisioneiro de si próprio”, “Quem me ama morre” e “O Mendigo de Almas”) não deixa ninguém indiferente quer seja pela crueza das ideias quer seja, ao menos, pela força das palavras.

(José Amaral)
Com esta época festiva a findar (termina a seis de Janeiro com a festividade dos Reis), e fazendo votos que os meus amigos "bloguesferianos" tenham tido um Santo Natal e tenham entrado em 2008 com o pé direito, cá estou de novo.
O AD LITTERAM começa o ano a postar um belíssimo poema de António Gedeão.

Dez réis de esperança

Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde me vem,
não comia, nem bebia,
nem falava com ninguém.
Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos à boca
e viesse o que viesse.
Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas
a cair impertinente,
aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,
não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,
essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,
se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.



(José Amaral)